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WILIAN MARQUES

Inerte

O mundo é como um grande organismo respirando em ritmo lento, um teatro do absurdo onde todos representavam papéis sérios demais para o roteiro cômico que lhes fora dado. As pessoas carregam expressões solenes, como se estivessem administrando impérios em crise, quando na verdade debatiam-se com torneiras que pingavam e pães que queimavam no forno. Havia um humor involuntário nessa seriedade exagerada diante de catástrofes domésticas, o drama de perder as chaves, a tragédia grega de derramar café na camisa branca.

O universo, em sua sabedoria perversa, parecia se deliciar com esses pequenos naufrágios cotidianos. Enviava chuvas inesperadas para penteados perfeitos, criava filas intermináveis para quem tinha pressa, fazia os celulares descarregarem nos momentos cruciais. Era como se uma divindade brincalhona observasse de cima, ajustando o mundo para produzir as situações mais comicamente frustrantes. E as pessoas, é claro, levavam tudo com a gravidade de quem negocia paz entre nações, a batalha épica para estacionar, o estresse cósmico de escolher um molho de massa, a angústia existencial diante de uma impressora que não conecta.

Havia beleza nessa comédia não intencional. No modo como um humano podia parecer um general estrategista ao decidir entre pão de queijo ou “croassão” na cafeteria. Como uma discussão sobre quem esqueceu a tampa da pasta de dente aberta adquiria tons shakesperianos. O verdadeiro espetáculo não estava nas grandes tragédias, mas nessas óperas-bobas domésticas onde todos se levavam demasiado a sério.

Refletindo, percebi o brilho genial dessa farsa universal. As pessoas não eram heróis trágicos, eram personagens de uma comédia divina, marchando com seriedade solene para lugar nenhum, lutando batalhas imaginárias contra inimigos invisíveis. Sorriu ao notar como o cosmos prega suas peças: fazendo-nos acreditar que somos os protagonistas de um drama existencial, quando na verdade somos figurantes numa revolução de palhaços. E a dúvida é se a verdadeira sabedoria está em rir dessa piada cósmica, especialmente quando percebemos que o chão que pisamos é nada mais que um palco giratório, e que amanhã haverá nova sessão desse mesmo espevatulo tragicômico que chamamos de vida.

 
 

Criado por Lady Cogumelo - Panorama SC

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