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WILIAN MARQUES

Cubículo


Ele entrou como quem foge de algo que não tem nome, algo que se arrasta atrás da nuca, silencioso, mas imenso.

Atravessou o corredor como se o chão fosse desabar a cada passo, e o ar, denso como fumaça de velas apagadas.

O prédio inteiro parecia respirar, num ritmo úmido, lento e doente. Luzes piscavam em sincronia com o pânico que se avolumava dentro dele. Nenhuma alma viva importava mais, nenhuma testemunha, apenas a certeza de que não havia tempo — e de que o próprio corpo estava por um fio.

Empurrou a porta com o ombro, entrou, trancou com força.

O trinco rangeu como se protestasse.

O cubículo era pequeno, menor do que qualquer memória podia justificar. Os azulejos pareciam suados, as rachaduras nas paredes formavam veias inchadas.

Havia um odor antigo no ar, algo entre ferrugem, mofo e coisa morta. O chão colava sob os sapatos, como se quisesse segurá-lo ali. Sentou-se, enfim. Ou afundou. Era difícil dizer.

Um tremor involuntário percorreu-lhe a espinha e ele fechou os olhos como quem se rende a algo inevitável. Sentiu-se vencido, tomado por um torpor morno, como se um véu tivesse sido arrancado de dentro para fora, sem aviso, sem piedade.

O som abafado de sua respiração preenchia o espaço, misturado ao gotejar irregular de algum cano oculto. Ele estava suando em demasia, as mãos trêmulas, os olhos úmidos. Mas por um instante, por um instante apenas, houve paz. E então, algo mudou.

O silêncio tornou-se mais denso.

O gotejar passou a ter ritmo, como um relógio marcando o fim.

O teto parecia mais baixo. As paredes... mais próximas.

O cubículo todo encolhia.

A luz fraca oscilava e criava sombras que se moviam sozinhas. O espaço entre seus joelhos e a porta havia diminuído.

Sentiu a garganta seca. Estendeu a mão para o lado, tateando em busca de alguma ancoragem na realidade.

Toques cegos, rápidos. Metal frio. Girou o cilindro. Uma, duas vezes. Vazio. Parou.

Tentou o outro lado. Nada.

Inclinou-se para frente, o suor agora escorrendo pela testa, o peito afundando como se a gravidade o puxasse para dentro do chão, o som das pessoas lá fora explodindo como um urro.

Girou o suporte mais uma vez, já sem esperança, apenas para confirmar o que seu corpo inteiro já sabia. O som foi seco, final.

O cubículo, agora, era um sarcófago.

E ele, um condenado. Nenhum papel.

 
 

Criado por Lady Cogumelo - Panorama SC

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