SÉRGIO MAESTRELLI
- MARCIA MARQUES COSTA

- 10 de set.
- 9 min de leitura

Venha caminhar conosco por esta rua e observe quem são os personagens desta via numa viagem pelo tempo na década de 60-70, na época de aluno do Ginásio e Colégio Rainha do Mundo por onde circulávamos diariamente. Conheça a Rua Joaquim Vieira Ferreira, que tem início numa das esquinas da Barão do Rio Branco e a primazia de desembocar em frente ao Parque Municipal Ado Cassetari Vieira, palco maior das festas e das manifestações culturais da gente urussanguense. Antes de avançarmos, olhemos para o outro lado da rua e lá estará a Estofaria Santa Rita de Juventino Guedes Ramos, pessoa do bem, da esposa Iraci e dos filhos João Carlos, Marinês, Milena e Carlos Miguel, o Nem.
A secular Metalúrgica do “Chico Dal Bó”
No interior das paredes desta construção, histórias de um esmerado serviço profissional, bem como centro de acontecimentos folclóricos. Lá dentro atuam quatro personagens: Francisco Dal Bó, o seu Chico, Romano Contessi, João Copetti e Irme Copetti. Lá eram fabricadas, peças ditas “melindrosas”. Numa época em que não havia peças de reposição para veículos, a solução estava no seu Romano (Rodolfo) Contessi. Muitas vezes, na adolescência, escutei essa frase de meu pai mecânico: “Vamos tentar. Vai lá e fala com o Romano. Só ele poderá retificar esta peça. Se ele disser que não dá, desista. Não tem solução.” Casos folclóricos também envolvem esse querido personagem da história de Urussanga. Numa época sem registro, Seu Chico chamou o Romano e disse. “Romano, se o fiscal do Ministério do Trabalho passar aqui esta semana e perguntar o seu nome, diga que você é o fulano de tal”. E não deu outra. Apareceu o temível fiscal do trabalho e perguntou ao seu Romano qual o seu nome. E o Seu Romano, nervoso disse: “Chico, como é mesmo o meu nome?” Na época não existia boleto, mas a multa já. E era paga em cruzeiros. Numa outra passagem, havia sido aberto um enorme buraco no terreno da firma, e numa noite de grande trovoada, um cachorro que por lá passava caiu e ficou preso no poço. Ficou latindo a noite toda, tirando o sono do Seu Romano que residia no terreno ao lado. Ao amanhecer, Seu Romano foi verificar o que havia ocorrido e encontrou o cachorro dando saltos tentando sair do buraco. Romano então colocou uma tábua inclinada dentro do buraco e no mesmo instante, o cachorro desesperado deu aquele salto rumo a salvação, chegando a derrubar o seu Romano no pulo. E ele se mandou como um raio, não sem antes ouvir do seu Romano a frase: “Mal agradecido”.
O primeiro instituto de Beleza
Você está defronte à casa do Seu Romano e Dona Juvelina, com os filhos Adolfo, Lucrécia, Arnaldo, José Roberto, o homem do pé de pato de Pelotas/RS. O Betinho Contessi, que no futuro se casaria com Mirian Lavina e deste casamento surgiu a Natália, e que se tornaria o segundo engenheiro da rua, já que o primeiro foi o Joaquim. Dona Juvelina Zanatta e sua filha Lucrécia cuidavam de realçar a beleza feminina. Possuíam um instituto de beleza. Por lá circulavam aos sábados e outros dias da semana, as beldades para os caprichados penteados da década de 60, em que o laquê e rolos de cabelo eram produtos indispensáveis. Todas elas, por vários minutos, utilizavam um parecido capacete de astronauta. Ao lado, numa construção mais recente, o Sobrado Contessi& De Bona Sartor, do casal de rotarianos Adolfo Contessi e Joanilda De Bona Sartor.A construção em três pavimentos tem escadas com vidros, permitem uma visão panorâmica dos arredores de dentro para fora e de fora para dentro, uma inovação para a época.
O Armazém do Carlinhos Spillere
e da Dona Constância
Nesse local você fazia suas compras e tudo era anotado na caderneta, cujo pagamento seria efetuado mensalmente. Anexa a esta construção, a residência dos meus padrinhos de crisma Valmor e Zulma Spillere Piva, com os filhos Luiz Carlos e Maurício. Luiz Carlos foi no passado proprietário de uma legítima bicicleta da Monark, a Monareta, símbolo do desejo da gurizada da época. Valmor Piva, na certidão, João Luiz, era alfaiate, sócio da SOCIR, integrante da Diretoria da SRU, que proporcionava um grande status social na época. Por lá desfilava a alta sociedade urussanguense. Valmor Piva também foi integrante do Rotary Club e produtor de vinhos na localidade de Rio Maior. Há uma vistosa Kombi estacionada na garagem nas cores azul e branco. Pode-se afirmar que foi um dos primeiros serviços de UBER de nosso município.
O caminhão Mercedes Benz do Salvir
Vamos avançando e nos defrontamos com a casa de Salvir Spillere e de Dona Jandira, com os filhos, Iva, Iraci (Colega de escola do Rainha do Mundo), Marcelo e Fátima. Seu Salvir, com um Mercedes Benz vermelho, rodou por décadas pelas estradas da Benedetta executando uma enorme gama de serviços. Eu e meus amigos andamos algumas vezes na carroceria desse caminhão. Há alguns anos por lá passando, numa coincidência, observamos a partida desse caminhão, deste símbolo automobilístico da rua sendo direcionado para uma empresa de Ferro Velho de Içara/SC. Havia chegado perto de seu final a história deste caminhão, depois de milhares de quilômetros rodados. Ele saiu da garagem depois de alguns anos estacionado e a pergunta inevitável: “Velho Mercedes-Benz da cor vermelho tomate, não tens saudades dos caminhos percorridos?” Caminhamos um pouco mais e enxergamos a residência de José e Marina Angulski Escaravaco, funcionários do IAPETEC. O Zeca Escaravaco circulava pela cidade com um Fusca marrom. Lá residiam os amigos Dado e Nancy.
A Casa de Bruno e Zelma Mariot
Hilbert e o campo de futebol
Bruno Hilbert, bancário, Dona Zelma, professora, e os filhos que também integravam a nossa turma. Hermes e Josi. Casa de madeira com tábuas na horizontal. Lá numa TV preto e branco assistíamos à tarde os filmes de Tarzan, Zorro, Tom & Jerry, Pica Pau e outros programas inesquecíveis. Aos fundos, num terreno baldio, construímos um campo de futebol de salão e fundamos o Palmeirinhas, com as camisas brancas da Hering 2 peixinhos, tingidas de verde num tacho por Dona Gervina Bez Batti Fréccia e a filha Marlene Fréccia. Ralaram os joelhos e perderam muitos gols os jogadores do Palmeirinhas: Hermes, Nazareno, Sandro, Neivan, Sérgio, Leo, Kiko, Kéio, Lênio, Ninho, João Carlos Ramos e seu irmão Nen, Betinho Contessi, Zé do Gelásio, Clezinho.
A memória deve ter falhado e esquecido de alguns amigos. Era o primeiro campo de futebol da rua. Anos mais tarde neste terreno foi construída a residência com sua bela arquitetura da família de seu Otávio Zannin. Sua filha Girlene, foi colega de escola do Rainha do Mundo.
Vamos caminhando e chegamos à casa do Gelásio e Luci Possamai. Olha também a casa do Chico Dal Bó, a casa da Dona Zuleima e do Rubens Mendes Martins, o folclórico Binha, emedebista nato, com os filhos Ricardo, o Chellas, Rita e Morgana. Dona Zuleima, a eterna diretora do Grupo Escolar Barão do Rio Branco. Binha histórico no Movimento de Irmãos. Surge a casa de Vitório Da Ré Zanatta e de Dona Olga Mazzucco, com os filhos Olguinha (amiga e colega do Rainha do Mundo) e o irmão Giovani bastante rebelde para os padrões da época, uma casa com traços modernos construída pelo Luli Cesca. A casa do Gentil de Oliveira Souza e a esposa da Luci Damiani. O Gentil, boêmio e motorista da ambulância do IAPETC, na época do agente Dionisio Damiani. Eles eram presença diária na Mecânica Urussanguense. Gentil foi um dos fundadores do emblemático Clube dos Treze. Por lá, o amigo Cléo Damiani. A rua também pode ser denominada da rua das duas Luci. Olha lá a Dona Gema e o Lady Damiani em sua residência descansando numa rede. A rua também teve uma construção que abrigou no passado uma fábrica de balas de banana. Minha mãe trabalhou por lá quando cursava o famoso regional que formava professoras primárias. Ela havia guardado alguns papéis destas balas. Os proprietários? Aires e Adenis Zanatta, que também abasteciam os salões das igrejas do interior com bebidas através de um caminhão Chevrolet ou Ford da década de 40-50. Por lá circulando num corcel I laranja, os dois amigos Eduardo e o Kamelo Zanatta. Na esquina, a família Concer, proprietária da famosa loja das bicicletas na Presidente Vargas, que anteriormente pertencia à família Serafim. A construção foi demolida para dar lugar a um espaço vazio. Façamos uma pausa e falemos um pouco sobre o personagem que empresta o seu nome a esta rua.
Joaquim Vieira Ferreira

O engenheiro Joaquim Vieira Ferreira, maçom, administrador da colônia italiana, mentor da praça triangular de Azambuja e posteriormente da praça triangular de Urussanga, fundador de Azambuja e de Urussanga, veio do longínquo Maranhão, onde nasceu em 9 de fevereiro de 1941 e faleceu no dia 17 de novembro de 1913. Fiel cumpridor de seus compromissos como administrador número 1 da colônia, teve o respeito dos imigrantes que aqui chegaram, conforme atesta Luigi Marzano em sua obra que relata os primórdios de Urussanga ‘Colonos e Missionários Italianos nas Florestas do Brasil.
Monsenhor Agenor Neves Marques enaltece em versos o Engenheiro Joaquim Vieira Ferreira: Vieira Ferreira - Nobre filho das auras encantadas/ Das plagas do longínquo Maranhão/A terra inculta que mediste a palmo/Hoje te rende eterna gratidão/
A flor que tu plantaste em Azambuja/Agora desabrocha perfumada/ Magnólia Branca, flor da imigração. Azambuja - ejus basis, Urussanga - flor basis.”
Consta que ao sair do Estado do Maranhão para SC, sua mãe deu de presente uma taça, afirmando: “Cuide bem dessa taça em suas andanças e caminhadas e cuide de você mesmo, porque sua saúde é frágil como essa taça. Se ela se quebrar em suas mãos, é um mal presságio.” E a taça seguiu o fundador por todos os caminhos tortuosos da mata atlântica e não se quebrou. Bom presságio.
No resgate dos descendentes do fundador, registra-se todo o trabalho penoso para localizá-los e Panorama foi eficiente e feliz em sua missão.
Quatro descendentes de Vieira Ferreira localizados pelo jornal e com o apoio do prefeito da época- José Vânio Piacentini, estiveram em Urussanga sendo eles, uma neta, duas bisnetas, e o trineto com sua filha.Oportunidade em que participaram da inauguração da pavimentação da rua que leva o nome do fundador.
E nós que nada fizemos, só resta uma alternativa. Parabenizar e enaltecer quem o fez. Então, o reconhecimento e a homenagem ao engenheiro agrimensor que incansavelmente mediu todos os lotes para abrigar os anseios e sonhos de nossos antepassados. Maranhão e Urussanga unidos por um nó górdio, ou seja, aquele nó que não se desfaz.
A Vieira Ferreira, o tributo da nossa geração.
Retornando pelo outro lado da rua
Saindo da história, vamos caminhar fazendo o retorno pela outra calçada. Olha o Atílio Damiani e Maria de Souza com os filhos Levi, Leni, Lênio, Lezzy, Lenita, Lévison, este último companheiro de escola do Rainha do Mundo, Olha lá o Atílio saindo com o seu automóvel preto, com seu Jeep e posteriormente com seu Opala PM 0003, cuja placa deu de presente ao meu pai, seu mecânico de longa data e que afixamos no Corcel II 1980 - Azul Gemini Metálico que circulou por mais de 100 mil quilômetros pelo Verde Vale do Itajaí. Esse veículo gastou pneus entre Urussanga e Timbó. Atílio, o homem do Cartório, dos registros de casamentos, nascimentos e falecimentos. Quem dos urussanguenses mais antigos não tem uma certidão constando o seu nome? O referido é verdade e dou fé.
Você se defronta também com uma bela residência branca de estilo moderno. A casa da Elaine Damiani e do Fernando. Essa residência e a residência de Lordy Damiani e dona Adília De Pellegrin, são consideradas por mim como joias da arquitetura urussanguense. Depois da área de domínio da Empresa São José, chegamos à casa do Ângelo Rota, e da dona Alexandrina, dos filhos Valcir e de suas duas irmãs. “Valci”, grande jogador de futebol de salão e funcionário da JUCIL com seu tio Valdomiro Fréccia. Como esquecer das bolachas e das massas JUCIL? Sabor da infância e da adolescência e ainda nos dias atuais nas prateleiras dos mercados. Vem a casa do popular amigo Siloca. Na esquina da Luiz Gilli, a casa da família de Valmor Moretti e Ester Zanelatto, com os filhos Sandro e Gladys (Nega). Dr. Haroldo Bez Batti e Edla Canela na sequência. Mais tarde por lá a residência de uma renomada professora de Língua Portuguesa, Professora Arlete Fréccia Sales. Numa construção mais recente, a residência do Babi Ferraro e da antropóloga da USP Sônia Ferraro Dorta.
Há um campinho de futebol esperando por nós. Ele foi construído pela gurizada que dividia seu tempo com brincadeiras de bang-bang e das cabanas do Tarzan. Jogávamos a bola de modo proposital dentro da chácara da Casa do seu Rômulo Mazzucco e do seu Dionisio Pilotto. Oficialmente pulávamos a cerca para buscar a bola, mas na realidade o objetivo eram as laranjas. Partidas memórias de futebol foram lá realizadas com as famosas “bolas de pneu”. Era o segundo campo de futebol da rua. Suados corríamos para a água da torneira no tanque de lavar roupa da Casa do seu Salvir. Éramos arteiros em grau máximo. Laçávamos carochas, roubava-se laranja, jabuticaba, carambola, goiaba, limãozinho. Construíamos cabanas e colecionávamos carteiras de cigarro. Que tempos de uma infância e adolescência riquíssimas. Sempre desejei aos meus filhos e netos, que tenham a feliz infância que eu tive. Também num prédio mais recente, as amigas Assunta Marchetti da Cidasc, a amiga do “se espalhou, azunta”, e da professora Regina Dalsasso. E terminamos com as duas residências do casal Albino Belloli e Dona Leda Mariot, com o grande amigo João Carlos Belloli. A primeira ocupada por décadas pelo alfaiate Jacó Uliano e sua esposa costureira. O casal que marcou a vida do Lions Clube. O seu Albino da Casa São Cristóvão, do DKW motor dois tempos (“Dampf-Kraft-Wagen” ou Carro de Força) que foi vendido para o Adolfo Contessi e do Corcel I-4 portas, cor laranja, hoje nas mãos de Eron Zaniboni. Dois automóveis relíquias do automobilismo nacional. Ufa! A rua é mais um pedaço de Urussanga carregada de história. Ah! A Rua Joaquim Vieira Ferreira também pode ser denominada de a nossa BR-101 devido ao fluxo constante de comboios de caminhões pesados, que fazem o chão tremer não é mesmo Joanilda de Bona Sartor Contessi? Numa das próximas edições enfocaremos uma outra via, uma outra rua. Poderá ser a sua.








