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SÉRGIO MAESTRELLI

EM TEMPO DE RITORNO


26 de maio de 2025 - Dia da beata Vergine di Caravaggio. O calendário marca os 147 anos da fundação da Colônia Urussanga com imigrantes belluneses, trevisanos, trentinos. Posteriormente os bergamascos nas montanhas de Belvedere e Montagnú. Eles chegavam com nomes como Vincenzo e Marieta, Francesco e Giovanna, Stéfanno e Margherita, Tóni e Carmella, Luigi e Albina, Emílio e Hipólita, tutti benvenutti. Anônimos imigrantes que firmes em seus propósitos e ideais lançaram os alicerces de Urussanga. Traziam em seus baús de madeira rústica, imagens de santos padroeiros de suas comunes, poucas roupas.

Algumas lembranças da Itália que ficara distante, mudas de parreira e traziam algo que não ocupava espaço – Suas almas. Aqui materializaram seus sonhos e realizações. Fui buscar nas minhas caixas de papel, o texto que escrevi quando minha nonna completava 99 anos, festejada com uma caneca de vinho tinto de uva tercy. Escrevi: Minha Nonna. Tu que te levantas do teu leito de colchão de palha e travesseiro de penas antes do despertar da aurora. Tu, com este teu lenço azul amarrando teus cabelos brancos. Eu que contemplo esta tua face expressando mil fatos vividos em todos estes anos contando a história deste lugar e de suas vidas. De que fonte vem a força que sempre te impulsiona para frente, para o futuro. Você que sempre quis tudo em movimento e nada de águas paradas. Diga-me nonna, conta-me sem receio, qual é o teu segredo? Eu vim de uma família onde a nonna era o centro de tudo.

Na história da imigração, nenhum neto e nenhuma nonna trocaram entre si tantos segredos e tantas confidências. Do neto Tchérgio para a Nonna Rosina Scarabelot Maestrelli, no livro – Atafona, Machine e Lavoro – A Família Maestrelli em Urussanga. Eu não falei apenas de minha nonna, falei também da tua nonna. Porque as nonnas, Deus em sua infinita sabedoria, as fez todas iguais. E que bom que assim é e que assim seja. Do nonno Vincenzo lá em Rio Carvão, que aos 86 anos insistia em amarrar a parreira com suas mãos trêmulas, traídas pelo reumatismo, herança da umidade das minas de carvão. Do nonno Tóni lá em Belvedere que em dias de chuva, com a calça arregaçada à meia canela, adorava caminhar de pés descalços pelos pastos molhados, e a cavalo ia na venda aos domingos para com os amigos jogarem mora ou triunfo e tomar aquela cachaça.

Depois na volta, “confetti” para os netos. A nonna Carmella que dividia seu tempo acolhendo netos e bisnetos, cuidando de seu quintal com ervas e chás, que à noite se dedicava à reza do terço e da recitação da ladainha de Nossa Senhora em latim e depois se ocupava sob a luz de uma lamparina ou gasômetro fazendo tranças com palha de trigo.

E como era suave ouvir em São Paulo de Montagnú os nonnos Luiz e Albina, Emílio e Hipólita no dialeto Bergamasco com tanti “su e zô”. No berço da imigração trentina em SC, no Vale do Itajaí, alguém escreveu e muitos cantaram.: L’Imigrante Italiano che in America arrivò/ um sacchetto sulle spalle solamente si porto/ Piano, piano Poveretto, la família sua fondò./Notte giorni a lavorar e il labor mai lo stancò.” Mérica, Mérica, terra di libertá. Dizem que eles nada tinham, então eu faço uma pergunta intrigante e misteriosa.

Se nada tinham, então como eles nos legaram tanto? Sua religião, suas crenças, seus usos, costumes e suas tradições, sua história. Suas raízes. Tem algo de errado nessa história. Não tinham nada e nos legaram tanto. E lembre-se que a árvore que despreza as suas raízes, seca. Hoje, Urussanga tem um belo canto do Biá cantado pela Bandalheia. E tem outra canção que ouvi com esse verso: “Ei, Urussanga querida, terra de um amor sim, hoje tu estás tão mudada, mas permaneces prá mim.” Uma das mais lindas e emocionantes declarações de amor por esta terra partiu do Pe. Luiz Gilli e sua trajetória. Padre Gilli sempre deixou claro aos seus paroquianos que no fim da vida gostaria de ser enterrado em seu lugar. Rifas e roletas foram feitas para angariar fundos. Doações em dinheiro se juntaram a estas. E no fim da vida, Pe. Gilli recebeu do povo de Urussanga presentes, o abraço e o dinheiro para voltar para a Itália. Voltou e uma grande tristeza e depressão dele se apossou. Com o restante do dinheiro recebido, embarcou num navio de volta para Urussanga. Numa das manhãs desse “retorno” ele teve um diálogo com um colono em frente à Casa de Sílvio e João Bez Batti, com o colono comentando: “Má, padre Gilli. Você sempre disse que queria morrer e ser enterrado em seu lugar. Mudou de ideia?” E ele respondeu: “Não caro mio, um não mudei de ideia. Eu sempre disse que queria morrer e ser enterrado em meu lugar. Só que eu me enganei de lugar. O meu lugar era Urussanga e não a Itália.” E assim se registrou as palavras: “Chão sagrado de Urussanga. Tu terás os meus sonhos, as minhas conquistas e as minhas frustrações. Tu terás o meu corpo e o meu espírito. Para Sempre”. E aí o padre Agenor cravou na lápide o “Sacerdos in aeternum” para aquele que em suas orações e missas dizia: “Que eu não perca nenhum daqueles a que o Senhor me confiou”. E ao seu lado a Irmã Faustina, a freira argentina mãe dos órfãos do Paraíso da Criança com a expressão latina “Inte Domine Speravi”, ou seja, “Em ti Senhor, coloquei todas as minhas esperanças”. Dia de reverenciar todos os nossos ancestrais, todos os nossos imigrantes que com seu trabalho, tenacidade, persistência, sacrifícios, arregaçaram as mangas, suaram suas camisas e nos legaram este belo lugar que hoje desfrutamos, que usufruímos. A prova mais cabal, mais clara e transparente de que eles foram vencedores é que hoje nós estamos aqui. Se fracassados fossem, nós simplesmente não existiríamos. Oggi é festa, non si lavora. Urussanga - 147 anos, apesar da idade, você para mim continua muito atraente, fascinante, exuberante, estonteante. Tanti auguri Urussanga, tanti auguri! Autoridades nós recebemos na sala e amigos na cozinha. O parque Municipal Ado Cassetari Vieira, o Parque do Vinho, será o Parque da Ritorno e se transformará numa grande cozinha para receber amigos. Então, nesta semana, “Ci troviamo nel parco.”

Houve uma época de grande duração na história do homem que o burro, a mula, o camelo e principalmente o cavalo eram verdadeiras Hilux 4x4 para seus donos. Teve também a época das lambretas, das motos, verdadeiros cavalos mecânicos. E nas décadas de 40 e 50 aqui no Brasil, quem possuía uma bicicleta possuía uma Hilux 4x4. Era a Hilux da época. Assim eram elas: emplacadas, equipadas com freio de mão, freio de pé, com espelho retrovisor, farol, dínamo, flâmula, antena, garupeira, cestinha frontal para transportar mercadorias, sineta, bomba para encher pneu e tripé para estacionamento. Só faltava a tração em duas rodas. Numa volta ao passado, a frase “meu reino por um cavalo”, foi substituída por “meu reino por uma bicicleta”. Em frente ao Grupo Escolar Barão do Rio Branco na década de 50, os primos Virgínio Maestrelli e Aldo Trento de Rio Carvão. E claro, homens tinham que usar chapéus. Na época, as mulheres tinham um olhar diferenciado para homens proprietários das vistosas bicicletas. Afinal, poder dar uma voltinha de bicicleta era um privilégio e tanto! (FOTO).

É tempo de Minestra. É tempo de Ritorno. Na mesa, aquela minestra com queijo, salame, torresmo, radiche no vinagre de vinho e uma taça de vinho. Um calor que espanta o frio. Aqui, na mesa do equipamento do Paraíso da Criança na Praça D’Itália.


PÍLULAS

  • Uma passagem nesta semana dos 147 anos de Urussanga. Ao me dirigir para a prefeitura para uma reunião, observamos esta cena. Um carro estaciona. Pai e filho descem do carro. A missão do pai? Bater uma foto com o menino de 4 ou 5 anos defronte ao Monumento do Imigrante. É evidente que esta imagem no futuro será olhada pelo filho com enorme carinho. Estava sem a digital Sony para registrar essa cena. Que pena!

  • “No Brasil não se deve duvidar de nada, pois acontece de tudo”. Fernanda Cancellier.

  • Bebês “Reborn” - O nome “reborn” significa “renascido” em inglês. É a onda infantil do momento. Uma bebê reborn é uma boneca de arte feita à mão que se assemelha a um bebê humano com o máximo de realismo possível. Levar essas bonecas que imitam bebês para consulta médica, aplicação de vacinas..., é demais. Para esta situação, a psicologia não deve ter antídoto. É um caso típico para ser resolvido com a consagrada expressão do Geraldo Custódio. É preciso o uso de “relho ou fuero no lombo”. Ou ter um encontro com o Prates lá na sua delegacia, que no quartinho do fundo, ele enquadra e resolve o problema. Como a sociedade anda materialmente e espiritualmente doente, vazia, só vivendo de fachadas.

  • Em Criciúma, o espaço do “Santa Vita Saúde Center” se transformou em “Santa Morte Saúde Center”. Resíduos acumulados, água parada, abandono, terra de ninguém. Que pena que aquele grande espaço arborizado, aquele espaço verde que no passado, ao lado do Hospital São José, servia de estacionamento e passeios às pessoas com familiares internados no referido hospital deixou de existir. A especulação imobiliária e a ganância produzem essas realidades, integrada por alguns espertos e outros que embarcaram na aventura com capital, dinheiro e sonhos desfeitos. O que era a promessa de um centro de referência médica virou um pesadelo. Não se constituiu num sonho de verão e sim num pesadelo de um tenebroso inverno.

  • Senado italiano aprovou e a Câmara sacramentou a lei que restringe ao máximo a transmissão de cidadania, ou no melhor português, acabou com a dupla cidadania. Praticamente liquida com essa questão, salvo raríssimas exceções. Foi uma tapa na cara e um soco na boca do estômago dos descendentes de italianos dispersos pelo mundo. É evidente que essa nova realidade atinge em cheio a preservação da cultura italiana pelas novas gerações. A Itália vai pagar um preço alto no futuro. Ah, vai!

  • “Já vou embora. É demais para o meu coleirinho.” Sérgio Costa, espirituoso na análise sobre a última sessão da Câmara.


ATTENTI RAGAZZI

A coisa está assim. As pessoas estão por dentro de tudo o que acontece na China e nada sabe do que acontece ali na esquina. Esqueça o celular, o Zap, esqueça o mundo e viva a vida em sua aldeia. Viva mais este Ritorno Alle Origini, edição 18.





Francisco ou “Francesco” Sartor, 3 anos, filho de Ezequiel Sartor e Rafaela Morais Sartor, acompanhado da babá Adriana Frassetto, foi clicado no carro de boi defronte ao monumento do chafariz da Praça. Observando a maquete com galo, pato, carneiro, ele disse para a babá Adriana, um: “Ué, não tem cavalo”?





É preciso se ajoelhar por esta terra. Tanti Auguri, Urussanga!

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